Chegamos a casa, pousamos a mochila da Escola e, lá dentro, como habitualmente, umas páginas de trabalhos para casa daquela matéria difícil que ainda não percebemos (provavelmente porque o professor explica mal, ou nem explica, como se pode comprovar pelo facto de toda a turma não entender, com excepção da Mariazinha e do Afonso, mas esses não contam porque entendem sempe tudo).
Com má cara e dois suspiros lá nos decidimos a tirar os cadernos, sabendo de antemão que não vamos conseguir fazer mas, já que tem que ser feito, pelo menos abrimos o caderno (é que na nossa cabeça, não conseguir fazer, ou não ter feito, são dois conceitos que se distinguem pela ténue diferença de abrir ou não o caderno).
Atiramos o caderno para cima da mesa, olhamos para ele fechado durante breves segundos e… optamos por começar por ir à casa de banho fazer um xixi, ganhando ali algum tempo.
Voltamos, sentamo-nos, suspiramos mais duas ou três vezes, abrimos o caderno na página do trabalho e recostamo-nos na cadeira olhando-o à distância… Suspiramos mais uma vez e… tomamos a decisão de nos levantarmos e ir comer umas bolachas ou mesmo lanchar (aqui existe uma diferença entre os mais experientes neste tipo de situação e os debutantes. Os mais experientes optam pelas bolachas pois permitirá interromper mais vezes o trabalho para as ir buscar à cozinha).
Esta é mais ou menos a altura em que alguém em casa se cruza connosco:
Mãe – Que cara é essa?
Nós – (silêncio acompanhado de suspiro)
Mãe – Passa-se alguma coisa?
Nós – Nada (acompanhado do ar mais “trombudo” que conseguirmos fazer)
Mãe – Precisas de ajuda?
Nós – Não (acompanhado de um ar de quem até precisava mas como é que a mãe ia conseguir ajudar numa coisa deste calibre?)
Ou
Irmã(o) mais velho – Então pá?
Nós – (silêncio acompanhado do pensamento – “no tempo dele só davam isto na Universidade”)
Irmã(o) mais velho – (Risos e segue o seu caminho)
Nós – (uma careta ou um gesto, mas só depois dela(e) ter saído do campo visual.
Ou
Irmã(o) mais nova(o) – Eu já acabei os meus trabalhos (normalmente naquela entoação – nhã, nhã, nhã nhã, nhããã… nhã)
Nós – Sai daqui.
Irmã(o) mais nova(o) – despacha-te, vamos brincar.
Nós – (almofada ou chinelo lançada em direcção ao pequenote)
Ou
Cão/Gato – (pára a olhar e faz uns barulhinhos)
Nós – Tu é que tens uma vida boa (acompanhado de um ar de – quem me der ser cão/gato)…
Cão/Gato – (Segue o seu caminho ou anicha-se indiferente)
A partir daqui é que a história varia.
Uns vão continuar cabisbaixos a suspirar e soprar, “infelizes” e com tal descrença em si próprios que mesmo que tentem fazer alguma coisa raramente conseguirão algum avanço (normalmente investem mais tempo a justificar a razão da situação do que a tentar resolvê-la).
Outros vão ter um impulso inicial de – “´bora lá” – que rapidamente desaparece ao primeiro problema, caindo imediatamente na situação descrita no exemplo anterior.
Outros vão arriscar dar uma oportunidade a si próprios. Não sabem se vão conseguir fazer o trabalho, mas começam por tentar pegar-lhe por uma ponta que, com a ajuda de um outro exercício perdido no caderno lá mais para trás começa a fazer sentido. Não suspiram há mais de 5 minutos e, a resolução do primeiro dos muitos passos do trabalho deu-lhes ânimo para continuar, trazendo um simbólico – yes – normalmente acompanhado de mais uma bolacha mas, desta vez, para premiar os avanços e não para ganhar tempo.
Neste caso, o desfecho ainda se desdobra em várias possibilidades. Umas vezes começam a conseguir resolver e vão até ao final com sucesso, outras vezes empancam a meio e voltam atrás empenhados em vencer o desafio iniciado (umas vezes conseguem sozinhos, outras vezes com ajuda, mesmo que seja da mãe ou do irmão mais velho, mas nesses casos é necessário não esquecer de reforçar que a parte mais difícil era a inicial e que essa eles não estariam à altura). Nesta última versão, mesmo sem dar por isso, já estão motivados a resolver o problema pois encontraram o prazer de TENTAR (por isso é que até procuram ajuda, nem que seja directamente com o tal professor que não explica nada).
Mesmo tentando, umas vezes conseguiremos mais, outras conseguiremos menos, mas encaramos o desafio e aprendemos sempre algo com ele.
Ah, claro, esqueci-me que ainda há aqueles que não tentam, não fazem e que continuam cheios de razão para o facto de terem escolhido o caminho mais fácil (que são um bocadinho diferentes, para pior, do primeiro exemplo que dei, pois os primeiros mergulham na sua tristeza, enquanto estes são donos de uma alegre verdade) … mas esses… bom, esses provavelmente nunca fizeram desporto e a solução será inscrevê-los rapidamente… na ESGRIMA.
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