O Mestre Szepesi tem na sua equipa jovem, um verdadeiro talento, a quem baptizámos de “Little Devil” por não sabermos o seu nome. É pequenito, mas tem uma noção de tempo fantástica e umas mudanças de ritmo invulgares, no entanto (e daí o nome que lhe atribuímos) tem uma atitude terrível. É completamente intolerante, não se conseguindo controlar perante os insucessos (nem que seja apenas um toque) e muito menos quando está em desacordo com o árbitro.
Observámo-lo em prova, local onde chora, grita, “faz trinta por uma linha”, sempre encoberto pela máscara que nunca tira (nem para ligar, nem cumprimentar, nem enquanto espera o jogo seguinte) escondendo assim a sua intolerância. Ficámos então a saber que, em treino, está proibido de jogar com o irmão, pois os assaltos entre eles ultrapassam todas as fronteiras do desporto, tornando-se verdadeiras batalhas.
Um pouco a pretexto deste tipo de situações o Marck, um Inglês que se juntou ao grupo na última semana (fez este curso em 2004 e regressa todos os anos para uma reciclagem de 3 a 4 semanas), questionou o Mestre Szepesi quanto à gestão deste tipo de conflitos extremos, uma vez que num treino, dois dos seus alunos abandonaram os sabres durante um assalto, encurtaram a distância entre si e “esgrimiram” com os punhos o resto do encontro numa pura cena de pugilato.
O Mestre hesitou numa resposta que pareceria simples, apresentando um ponto de vista muito interessante. Obviamente que qualquer situação extrema deve ser controlada, principalmente quando estão em causa situações de indisciplina mas… como fazê-lo na medida certa? Como reprimir a conduta mas… sem inibir a combatividade natural de cada um, tão essencial num desporto de combate. Como é que isto se faz? Bom, é aqui que entra o conhecimento, a experiência e a sensibilidade do Treinador, mas mais que tudo, o profundo conhecimento que deve ter de cada Atleta e a relação que estabelece com eles.
O professor de Teoria do Treino, Dr. Radák, terminou a sua última aula com a seguinte frase “Descubram os factores limitantes da performance do atleta e trabalhem-nos. Corrijam os erros mas preservem a individualidade de cada um”.
É verdade que esta referência se reportava aos aspectos técnicos e tácticos mas parece-me que se pode extrapolar para o campo comportamental conectando-o com a explicação do Mestre Szepesi.
Reflectir sobre este tipo de situações faz-nos compreender melhor as fronteiras da individualidade de cada aluno ou atleta. Por muito que queiramos respeitar e compreender as características de cada um a verdade é que é muito difícil analisar os outros sem estarmos viciados pela nossa própria maneira de pensar e de agir.
Acredito no entanto que, se estivermos despertos para esta dificuldade, estaremos mais perto de compreender e potenciar as características de cada Atleta e, sem dúvida, se cada um deles conseguir fazer o mesmo com o colega do lado, também o seu espaço estará preservado e o grupo enriquecido com a individualidade de cada um.